sábado, 10 de abril de 2010

A tragédia de Katyn, 70 anos depois

No último dia 07 de abril, o premiê russo Vladimir Putin visitou a cidade de Katyn, no oeste da Polônia, para prestar homenagem aos 22 mil oficiais poloneses sumariamente executados em 1940 pela polícia política soviética, a mando de Josef Stálin. Katyn sempre foi uma ferida aberta nas relações entre a Polônia e a União Soviética, e continuou a ser mesmo com o fim do comunismo no Leste Europeu. O episódio foi utilizado pelos próprios nazistas, que descobriram as valas comuns, para propagandear a suposta vilania dos comunistas aos poloneses e à toda Europa. Katyn também ilustra as diversas publicações a respeito dos crimes na história do comunismo soviético. O fato é que a elite militar e até intelectual da Polônia, menos de um ano após a invasão alemã em 1939, foi exterminada.

A visita de Putin me despertou o desejo de escrever um post sobre a memória do massacre e suas consequências, ou as novas relações entre a Polônia e a Rússia. Não tive tempo para escrever sobre o tema. Ironicamente, quando o presidente polonês Lech Kaczynski se dirigia para relembrar os mortos, o avião presidencial caiu na Rússia, a caminho de Katyn, matando todos à bordo.

Ironias históricas são mais comuns do que imaginamos, mas a maioria das pessoas não se lembra deles. Fatalmente os poloneses não esquecerão a data de hoje.

O cineasta Andrzej Wajda recentemente fez um filme espetacular sobre o episódio, que vale a pena ser visto

sexta-feira, 9 de abril de 2010

O morro não tem vez...

Até às 14h37 minutos desta sexta-feira, 09 de abril, já são 186 mortos no Estado do Rio de Janeiro, depois de uma semana de chuvas intensas no Sudeste. Embora os jornais e o poder público divulguem a tragédia "causada pelas fortes chuvas", o olhar mais acurado reconhece onde está a verdadeira causa, a origem do drama, a raiz da catástrofe.

A maioria quase absoluta das mortes ocorre entre os mais pobres, que viviam em favelas e encostas, zona desconhecida dos mecanismos estatais, a não ser nos justificáveis casos de especulação imobiliária e repressão policial. Um coro uníssono culpa o poder público, autoridades culpam o excesso de chuva, as mudanças climáticas. Para os mais místicos, é fim do mundo que se aproxima.



Pouca gente se lembra de onde veio aquela gente que ocupou aqueles espaços, nem as diversas razões estruturais que os empurraram para lá. Nem mesmo os 186 mortos até agora levantam a discussão de sua historicidade em qualquer debate. As quase 200 casas engolidas pela lama de um antigo lixão do Morro do Bumba, em Niterói, serão esquecidas em pouco tempo. O fato é que todos estão viciados e entorpecidos pelo tempo presente e assim permanecerão quando a lama secar e os atestados de óbito estiverem devidamente arquivados e computados nas estatísticas oficiais.

sexta-feira, 2 de abril de 2010

O microcosmo das raízes totalitárias

Ao ver "A Fita Branca", (Das Wiesse Band, do austríaco Michael Haneke), não pude deixar de me lembrar do controvertido livro de Daniel Jonah Goldhagen ("Os Carrascos Voluntários de Hitler: o povo alemão e o Holocausto", Cia das Letras). Não que a sofisticação cinematográfica de Haneke ("Caché", "A Professora de Piano") se compare à discutível tese de Goldhagen sobre a culpa do cidadão alemão comum na máquina genocida. Minha associação se deu por conta das críticas apontando o filme de Haneke como uma análise das raízes do nazismo no microcosmo educacional alemão em uma pequena vila durante a Primeira Guerra Mundial.

Concordo com algumas críticas sobre a tese já defasada das raízes psicológicas do nazismo (como apontada no Café História por Bruno Leal), mas ao mesmo tempo reconheço que o filme de Hanecke joga luz sobre as bases sociais do apelo ideológico fincadas na tradição e no processo educacional. O mais interessante do filme de Hanecke é que naquela vila alemã o processo pode ser facilmente reconhecido (assim como no interessantíssimo livro de "O Jovem Törless" de Robert Musil).

Para quem não viu "A Fita Branca", o trailer:



Para quem ainda não leu "O Jovem Torless", uma boa análise

E uma crítica lúcida ao livro de Daniel Jonah Goldhagen